Thursday, October 29, 2020

A INSTRUÇÃO É O ATALHO PARA A GENERALIZAÇÃO

Terminei de ler um artigo muito interessante sobre a pedagogia natural, escrito por dois psicólogos evolucionários húngaros (Csibra & Gergely, 2009). O artigo está disponível gratuitamente no Google Scholar. A hipótese evolucionária é que a pedagogia - ou seja, os esforços ostensivos para ensinar as crianças, para transmitir conhecimento - é uma estratégia evolutivamente estável.

A instrução é o atalho para a generalização.

Na interação direta com o mundo - leia-se "aprendizagem por descoberta" - a criança aprende indutivamente através da detecção de regularidades estatísticas (aprendizagem bayesiana). Sob essas circunstâncias, pode ser bem complexo generalizar a partir de um contexto específico, criando conhecimento genérico, abstrato e contextualmente inespecífico.


A comunicação ostensiva (instrução) por parte de um adulto é um atalho para a generalização. A instrução dá um by-pass em horas de aprendizagem levando a

diretamente à abstração. Uma instrução sinaliza para uma criança que um determinado referente não se aplica apenas a uma situação específica, mas se reveste de um significado genérico.


Dizer que a pedagogia é uma estratégia evolutivamente estável significa que o cérebro do adulto é hardwared para usar o cérebro da criança é hardwired para fazer o melhor uso possível desse transmitido.


Csibra e Gergely (2009) revisam evidências experimentais de que o cérebro do bebê é programado para a) conferir atenção preferencial a sinais ostensivos por parte do adulto, b) conferir significado referencial mais amplo aos objetos e eventos que são ostensivamente sinalizados pelo adulto e c) interpretar e codificar preferencialmente a comunicação referencial-ostensiva do adulto como conhecimento generalizável.


As crianças aprendem muita coisa observando e explorando as situações concretas. Nesses casos, entretanto, é difícil fazer generalizações. Na imitação, uma criança precisa inferir relações de meios e fins entre o comportamento do modelo e os objetivos alcançados. Na exploração, uma criança procede por tentativa e erro até que algum comportamento seja reforçado. A instrução é a via régia para a generalização. A auto-instrução pela leitura deveria ser o objetivo da educação escolar.


Além de ser capaz de aprender bayesianamente, detectando regularidades estatísticas e induzindo generalizações a partir de casos particulares, o cérebro humano é programado para instruir e aprender generalizações de modo mais direto, rápido e eficiente pela instrução. A instrução é o atalho para superar o contexto imediato, para ir além do aqui e do agora. Uma pedagogia que negligencia a instrução negligencia a estratégia evolutivamente estável que constitui a nossa cultura. Uma pedagogia que negligencia a instrução é uma antipedagogia. Algumas coisas são tão óbvias, que as pessoas acabam esquecendo.


Referência

Csibra, G., & Gergely, G. (2009). Natural pedagogy. Trends in Cognitive Sciences, 13 (4), 148-153.



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