Aprendi
a soletrar muito cedo, em casa. Mais tarde, na escola primária, fui um tanto
mimado pelas professoras, por causa do prestígio social de meu pai. Lia
correntemente, sabia o meu pouco de História do Brasil, tirava boas notas em
Lições de Coisas, mas tinha as piores relações imagináveis com os números, que
me causavam vertigens. Aprendi a duras penas três das quatro operações, mas
empaquei na conta de dividir. Como se aproximassem os exames de fim de
ano e estivesse correndo o risco de ser reprovado por causa da Aritmética, D.
Margarida Pardelhas, diretora da escola, me levou a
meu pai e lhe disse: “Fizemos tudo o que estava a nosso alcance, mas não
conseguimos meter na cabeça deste menino a conta de dividir”. Pronunciou estas
palavras apocalípticas e se foi no seu passo duro e marcial de coronel
prussiano. Fiquei envergonhado, com um calorão nas orelhas. Meu pai me
olhou e disse: “Acabas de receber o diploma de burro” (Veríssimo, 1974, p. 36).
Referência
Veríssimo,
E. (1974). Solo
de clarineta. Memórias. Primeiro volume (5ª.
ed.). Porto Alegre: Globo.