As
dificuldades comportamentais e de aprendizagem interagem de forma complexa com
a motivação através de vários circuitos de retroalimentação estruturados pelo
ambiente, os quais repercutem sobre o funcionamento familiar, escolar, social e
sobre o próprio auto-conceito. Neste ensaio são analisadas algumas das
manifestações deste processo interativo. O ciclo vicioso de retroalimentação
entre fracasso escolar e mau comportamento, de um lado, e desmoralização e
desmotivação do outro, tende a se cronificar e a se agravar. Os adultos, pais e
educadoras, estão em melhor posição de romper um tal ciclo vicioso. Mas isto
exige determinação e auto-controle por parte do adulto. A expectativa é que
este artigo contribua para que pais, educadoras e profissionais de saúde
construam uma representação mais clara da natureza e conseqüências dos
problemas comportamentais e de aprendizagem e de sua interação com aspectos
motivacionais, bem como dos fatores que os agravam e dos fatores e
possibilidades de melhoria.
COMPORTAMENTO,
APRENDIZAGEM E MOTIVAÇÃO
Os
seres humanos somente se motivam para fazer aquilo que é do seu interesse ou
que percebem estar ao alcance da sua competência. Quando a pessoa acredita que
ela gosta e/ou consegue realizar uma tarefa com um pequeno esforço, ela irá
dispender energia na realização da mesma. Caso a pessoa perceba a tarefa como
aborrecida ou estando acima do seu alcance, ela se desmotiva. As dificuldades
de aprendizagem desmotivam e desmoralizam o jovem, além de desgastarem as
relações familiares. Crianças/adolescentes, pais e educadoras ficam ansiosas e
frustradas em função do mau rendimento escolar e/ou do mau comportamento. A
atenção dos pais e educadoras concentra-se nas dificuldades, desviando-se dos
comportamentos adaptativos dos jovens, os quais são percebidos como mera
obrigação da criança. O foco nas dificuldades e negligência dos comportamentos
adaptativos constitui uma forma de reforçamento diferencial, o qual agrava
ainda mais os problemas.
Confrontada
com dificuldades persistentes, com um nível de exigência percebido como acima
das suas possibilidades, captando a ansiedade comunicada de forma implícita
pelos adultos, o jovem vai progressivamente se desmoralizando e se desmotivando
para o estudo e para o comportamento adaptativo. O passo seguinte neste
continuum é o agravamento das dificuldades de aprendizagem acompanhado do
surgimento e/ou agravamento das dificuldades disciplinares e comportamentais
freqüentemente comórbidas com os transtornos de aprendizagem.
APRENDIZAGEM
NATURAL E FORMAL
Os
seres humanos nascem com a capacidade de adquirir intuitivamente um conjunto de
habilidades cognitivas e sociais. As chamadas habilidades primárias são
aprendidas naturalmente, sem que haja necessidade de um processo formal de
educação. As principais habilidades primárias dizem respeito ao conhecimento
dos seres vivos (animais e plantas), do espaço e do mundo físico, das relações
quantitativas e de causa-e-efeito. Outro domínio intuitivo importante é o do
conhecimento e capacidade de regulação do próprio comportamento e dos outros
indivíduos (“inteligência” emocional e social, auto-regulação, habilidades
sociais). O desenvolvimento destas habilidades ocorre naturalmene, exigindo
apenas que a criança seja estimulada pela família e pares, que o indivíduo
interaja com o mundo físico e social.
Existe,
entretanto, todo um conjunto de habilidades que não são intuitivamente
adquiridas. As chamadas habilidades secundárias exigem a intervenção de uma
pedagogia, de técnicas formalizadas de ensino. Exemplos de habilidades
secundárias são a leitura e escrita, a notação arábica, a tabuada e os
algoritmos aritméticos. As habilidades secundárias são aquisiçoes culturais
construídas a partir de capacidades instintivas apenas às custas de muito
esforço e do desenvolvimento de técnicas apropriadas.
Todos
comportamentos, dos mais simples aos mais complexos, são aprendidos pelas suas
conseqüências. Se o comportamento leva a conseqüências desejadas pelo indivíduo
ele aumenta de freqüência, aperfeiçoa-se e transforma-se em hábito. Se as
conseqüências do comportamento são desagradáveis, diminui a propensão do
indivíduo para emití-lo no futuro. Reforços são estímulos que aumentam e
punições estímulos que diminuem a freqüência de comportamentos.
Todo
comportamento é aprendido pelas suas conseqüências. Mas nem todo reforço ou
punição precisa ser experimentado diretamente pelo individuo. A aprendizagem
social envolve a observação das conseqüências do comportamento alheio e a
imitação de comportamentos conducentes às conseqüências que o individuo almeja.
A aprendizagem social exige uma certa capacidade de representação mental
(cognitiva). Para aprender por imitação o observador precisa compreender quais
são as intenções do modelo, ou seja, a capacidade de representar o mundo a
partir da perspectiva do modelo. Pais e educadores transmitem conhecimentos e
habilidades verbalmente para seus filhos e alunos, mas, principalmente, pelo
seu comportamento, que serve como modelo. Não adianta nada o pai dizer para o
menino que o mesmo não deve fumar maconha, se o pai enche a cara quase
diariamente.
A
aprendizagem cognitiva, por outro lado, requer que o indivíduo tenha a
capacidade de representar mentalmente cenários preditivos das conseqüências dos
seus atos. O indivíduo antecipa que determinado comportamento levará a
conseqüências negativas e aprende a evitá-los. Por outro lado, comportamentos
cujas conseqüências são antecipadas como positivas, tendem a aumentar de
freqüência e a se automatizar. Ou seja, transformam-se em hábitos ou segunda
natureza. A educação é o cultivo dos bons hábitos. A pessoa educada funciona de
modo adaptativo sem precisar pensar, no piloto automático. As habilidades
secundárias exigem instrução formal e exercício intenso e prolongado para se
automatizarem.
DIFICULDADES
ESPECÍFICAS DE APRENDIZAGEM
Alguns
indivíduos com inteligência normal podem apresentar déficits em certas
habilidades primárias específicas. Apesar de a pessoa não ser deficiente
mental, essas dificuldades específicas podem prejudicar muito o comportamento
e/ou o processo de aprendizagem escolar, acarretando conseqüências sociais e
psicológicas adversas. A aquisição de habilidades secundárias exige a
integridade das habilidades primárias e somente ocorre com a intervenção de
instrução formal. A aquisição de habilidades secundárias exige esforço do
individuo para automatizar as aquisições realizadas. Somente o exercício
permite a automatização e sem automatização não há como ler de forma eficiente
e prazeirosa ou realizar as operações aritméticas com a presteza demandada pelo
ambiente comercial e profissional. Três são os dominios de habilidades
primárias em que pode haver déficits específicos com potencial para prejudicar
a aprendizagem: a linguagem, as noções de espaço e quantidade e a
auto-regulação.
DIFICULDADES
DE APRENDIZAGEM RELACIONADAS À LINGUAGEM
A
aquisição do código alfabético exige que o indivíduo aperfeiçoe a habilidade de
analisar mentalmente as palavras nos seus fonemas constituintes,
correlacionando a seguir uma representação mental de cada fonema com sua
representação gráfica por meio de letras. As pessoas que têm dificuldades com
esta habilidade são categorizadas como disléxicas. A pessoa pode ser
inteligente e normal em todos os outros aspectos. Mas apresenta um déficit
muito específico na capacidade de correlacionar rapidamente os estímulos
ortográficos com as representações sonoras pertinentes. A falta de presteza
neste processo de recodificação fonológica acarreta dificuldades com a
automatização da leitura. As dificuldades com a automatização da leitura
causam, por sua vez, déficits na compreensão de textos e asssim por diante.
Para ser eficiente e prazeirosa a leitura precisa ser rápida, automática. A
falta de automatização prejudica o desenvolvimento do processamento textual,
repercutindo posteriormente sobre a aprendizagem de disciplinas tais como
geografia, história etc., as quais exigem habilidades de compreensão de textos.
Muitos indivíduos diagnosticados como disléxicos apresentam história de atraso
para aprender a pronunciar corretamente as palavras, apresentando trocas e
omissões de fonemas (dislalias). Existem evidências de que a dislexia se deve a
uma inércia dos mecanismos da linguagem no hemisfério esquerdo. Quando a
criança compensa as dificuldades fonológicas (dislalias) ela se defronta com a
missão de aprender a ler sem dispor de mecanismos que possibilitem a
automatização do processo. As dificuldades crônicas de aprendizagem da leitura
repercutem negativamente sobre a auto-estima e a motivação, contribuindo para
desencadear ansiedade e/ou comportamentos inadequados.
DIFICULDADES
COM O ESPAÇO E O NÚMERO
Outro
grupo de crianças com inteligência normal apresenta dificuldades na intuição
das relações espaciais e do conceito de número. A aritmética é uma disciplina
que se baseia na automatização progressiva de uma série de habilidades. Se o
indivíduo não automatiza ou não adquire uma intuição para determinado domínio
da matemática, essas dificuldades repercutirão nas fases subseqüentes da
aprendizagem. Como nenhuma outra disciplina em igual grau, a aritmética é
organizada como um edifício no qual um tijolinho se assenta sobre o outro. Se
falta uma base, não há como progredir. As evidências indicam que as habilidades
ariméticas também podem se dividir em prmárias e secundárias. E que as
habilidades secundárias exigem instrução formal, mas se fundamentam nas
habilidades primárias. As habilidades aritméicas primárias se baseiam em uma
concepção não-simbólica de grandeza que está presente nos animais e bebês. A
partir da noção primitiva de numerosidade, a qual é de natureza analógica e
espacial, desenvolve-se progressivamente uma noção simbólica de número. O
surgimento do conceito simbólico de número depende da interação com as
habilidades verbais de contagem. A partir da interação da contagem verbal com
representaçõe concretas, tais como aquelas fornecidas pelos dedos. a criança
intui, espontaneamente, os princípios aritméticos que permitem a realização das
quatro operações.
Crianças
com dificuldades nas intuições numéricas básicas apresentam dificuldades na
aquisição de habilidades matemáticas secundárias. As principais habilidades
aritméticas secundárias são a notação arábica, a tabuada e os algoritmos que
facilitam e agilizam as opoerações com números maiores. A aprendizagem da
notação arábica impõe demandas pesadas do ponto de vista de habilidades de
representar relações espaciais e de pensar de modo abstrato. A automatização
dos fatos aritméticos e dos algoritmos exige, por outro lado, capacidade
verbal, de atenção, memória de curto-prazo e, sobretudo, muito exercício. As
demandas por exercício, impostas pela aprendizagem da matemática, limitam a
aprendizagem dos indivíduos distraídos, imulsivos e impersistentes. Crianças
com dificuldades de aprendizagem da aritmética que apresentam déficits nas
habildiades primárias são diagnosticadas como portadoras de discalculia. Mas as
dificuldades de aprendizagem da matemática podem ser causadas também por
fatores motivacionais, tais como ansiedade, estimulação inadequada e más
experiências escolares.
DIFICULDADES
COM A AUTO-REGULAÇÃO
A
aprendizagem escolar exige muita capacidade de motivação e auto-controle. A
escola exige que a criança concentre sua atividade em tarefas aborrecidas para
ser recompensada no futuro. Algumas crianças têm dificuldades com este
processo. Certas crianças têm um temperamento mais difícil, desde muito
novinhas. Essas crianças são mais imediatistas, exigem mais atenção dos pais.
Querem tudo prá ontem. Há evidências em culturas pré-tecnológicas de que as
crianças com temperamento mais difícel têm maior probabilidade de sobreviver
porque demandam e recebem mais cuidados em ambientes onde os recursos são
escassos. Mas o temperamento dificil pode dificultar a aprendizagem escolar
formal. Ao ser pouco estimulada ou estimulada excessivamente a criança agita.
Exemplo de hipoestimulação é não ter com que se divertir. Exemplo de
hiperestimulação é ser confrontado com uma tarefa que o indivíduo não consegue
resolver. Ao se confrontar com uma tarefa percebida como acima das suas possibilidades
o indivíduo agita, não consegue se concentrar, não consegue persistir com a
tarefa.
As
evidências científicas disponiveis mostram que as crianças agitadas e com
temperamento difícil têm déficits nos mecanismos cerebrais de recompensa. Estes
indivíduos são imediatistas, precisam ser reforçados logo após o comportamento
ser emitido. Se o reforço demora, o traço entre o comportamento e o reforço se
esvanece. Tais crianças nâo conseguem aprender se existe uma demora entre o
comportamento e o reforço. As crianças com temperamento difícil somente
aprendem se são recompensadas freqüentemente e imediatamente após a emisão do
comportamento que deve ser reforçado. Há evidências de que as crianças
hiperativas não conseguem representar de modo tão eficiente na memória de curto
prazo as recompensas futuras associadas a um dado comportamento, de modo que o
mesmo seja reforçado.
Além
de não persistirem na tarefas, as crianças agitadas e com temperamento difícil
freqüentemente se envolem em comportamentos percebidos pelos adultos como
importunos. O adulto então reage punitivamente. A punição pode desencadear
conflitos de autoridade entre a criança e os pais ou educadoras. Nestas
circunstâncias, a punição somente agrava o mau comportamento, uma vez que os conflitos
podem se cronificar sob a forma de interações coercivas ou de conflitos de
poder.
CICLO
DE INTERAÇÕES COERCIVAS
Sempre
que a mãe dá uma ordem a criança tem a possibilidade de obedecer ou não
obedecer. Se a criança obedece, a família vai tratar da vida. Mas algumas
crianças são teimosas e não obedecem tão prontamente. Quando a criança não
obedece de imediato, a família tende a repetir a ordem até umas três vezes. A
criança pode, então, obedecer ou continuar desobedecendo. Se a criança insiste
em não obedecer, os pais repetem a ordem mais algumas vezes. Se as dificuldades
persistem, os pais ameaçam com castigos, elevam o tom de voz etc. A criança
sempre tem a opção de obedecer ou não. Se a criança persiste na desobediência
os pais cairão em um beco sem saída, do qual nenhuma opção leva a qualquer
lugar. Caso a mãe ceda, estará ensinando a criança a desobedecer. Da próxima
vez que a mãe emitir uma ordem o jovem saberá que se ficar pé e não ceder,
acabará dobrando a mãe. Isto se chama de reforçamento negativo. Por outro lado,
se mãe não ceder e partir para o castigo incorrerá nos efeitos colaterais da
punição. A espiral punitiva pode escalar para abuso e toda um série de
conseqüências indesejáveis. A repetição de episódios de interação coerciva como
os descritos acima desgasta o relacionamento familiar, afasta os pais da
criança e não contribui em nada para melhorar as dificulades. Ao contrário, as
interações coercitivas acabam se transformando em um verdadeiro estilo de
relacionamento familiar, o qual tende a se cristalizar e cronificar,
tornando-se progressivamente mais difícil de modificar. Uma vez iniciada a
interação coerciva não há o que se possa fazer para resolver a situação. Pais e
educadoras precisam aprender a agir proativamente, evitando as interações
coercivas. Através da interação coerciva perdem todos. Perdem os adultos pelo
estresse, perde a autoridade pelo desgaste e perde a criança pelo desperdício
de oportunidades para adquirir habilidades e aprender a se comportar
adequadamente.
A
punição não rompe o ciclo das interação coercivas, contribuindo, ao contrário
para agravá-lo. A punição pode deixar o individuo revoltado, fazendo com que
ele se comporte deliberadamente de modo inadequado. É importante considerar
também que os individuos com tendências psicopáticas são insensíveis aos
efeitos da punição. Só existe um modo de romper o ciclo das interações coercivas:
através do reforçamento diferencial dos comportamento adequados e da retirada
de atenção dos comportamentos inadequados. Apenas ignorar o comportamento
inadequado tende a agravá-lo. Para reduzir o comportamento inadequado é
importante antecipá-lo, remover ou prevenir as situações que possam evitá-lo e,
simultaneamente, focalizar os bons comportamentos ao mesmo tempo em que os maus
comportamentos são ignorados.
CICLO
MOTIVACIONAL DA AUTO-ESTIMA
Uma
deficiência não é uma característica exclusiva do indivíduo, mas de uma relação
do indivíduo com o meio. Pais e educadoras têm expectativas sobre o desempenho
escolar e/ou comportamento da criança. Quando a criança não corresponde às
expectativas caracteriza-se uma deficiência ou comportamento inadequado. Ao
perceberem a discrepância, todos os envolvidos, pais, educadoras e crianças
podem ficar ansiosos. A percepção das discrepâncias não contribui em nada para
aliviá-las. A persistência das discrepâncias tende a agravá-las. O desempenho
escolar insuficiente reduz as expectativas dos pais, professoras e da própria
criança quanto ao seu desempenho. Ao sentir-se incompentente diminui a
motivação para o estudo e, como o indivíduo investe menos no desempenho escolar
o mesmo diminui progressivamente. À medida que o desempenho escolar diminui,
baixa também a auto-estima e o status social do aluno.
Se
a criança estuda um pouco e tira uma nota razoável, da próxima vez ela irá se
esforçar mais para melhorar a nota e este processo pode levar a uma espiral
virtuosa de melhora do deseempenho escolar. Por outro lado, se o aluno tem
dificuldades e tira nota baixa, ele ficará desmotivado e estudará
progressivamente menos, comprometendo cada vez mais sua aprendizagem.
Um
processo semelhante ocorre com o comportamento. O mau comportamento
cronicamente percebido tende a aumentar seu impacto subjetivo. Quanto mais
tempo o mau comportamento dura, mais importuno e grave ele se torna na
percepção dos envolvidos e mais impotentes os adultos e jovens se tornam para
lidar com as dificuldades decorrentes. A persistência de dificuldades escolares
e mau comportamento faz com que todos os envolvidos desenvolvam expectativas de
desemparo, de que o problema é muito grave, sem solução. De que não há nada que
se possa fazer.
Só
existe um modo de romper o ciclo da discrepância entre o critério inatingível e
um comportamento percebido como insuficiente ou inadequado: relaxar o critério.
Se os pais e educadoras relaxam o critério, as metas de comportamento ou
aprendizagem aproximam-se do alcance da crianças. Os seres humanos não se
motivam por metas inatingíveis ou alcancáveis apenas às custas de um esforço
hercúleo. Estabelecer metas tem um efeito motivador apenas quando elas são
estabelecidades de comum acordo com o aprendiz e quando o estudante as percebe
como estando ao seu alcance com um pequeno esforço. O princípio de rebaixar o
critério, para posteriormente ir elevando-o sucessivamente à medida que as
metas vão sendo cumpridas constitui a base de uma estratégia muito eficaz
denominada de aprendizagem sem erro. Crianças que se comportam mal ou têm
dificuldades de aprendizagem devem ser ensinadas pelo estratégia da
aprendizagem sem erro.
APRENDIZAGEM
SEM ERRO
Uma
das formas mais eficazes de atenuar as dificuldades motivacionais e ajudar a
resolver os problemas de aprendizagem é representado pela proposta da
aprendizagem sem erro. A aprendizagem sem erro se baseia no pressuposto de que
o erro interfere de diferentes maneiras com a aprendizagem. Após aprender
errado o trabalho é dobrado para desaprender o errado e aprender o certo. O
erro interfere com a aprendizagem. O fracasso frustra, desmotiva e desmoraliza.
O primeiro passo então é realizar um diagnóstico preciso do perfil de pontos
fracos e fortes, do domínio dos conteúdos curriculares e do estilo de
aprendizagem e pensamento da aluna.
A
partir do diagnóstico do nível de domínio curricular, do estilo cognitivo e do
perfil de pontos fortes e fracos é possível programar o grau de dificuldade das
tarefas, de modo tal que elas se situem ao alcance do aluno, com um pequeno
esforço. As técnicas de ensino programado ilustram o processo. O grau de
dificuldade é hierarquizado e a aprendizagem procede passo a passo. Os novos
conteúdos são introduzidos gradualmente. Os pressupostos para a compreensão dos
novos conteúdos foram recentemente exercitados no passo imediatamente anterior
da seqüência. Testes são realizados com freqüência, para verificar o progresso.
As respostas às questões de testes constam na própria pergunta. O sucesso na
realização dos testes com dificuldade progressiva permite que a aluna acompanhe
seu próprio progresso e desenvolva um auto-conceito de competência para
aprendizagem. A redução da ansiedade e frustração crônica associada ao fracasso
promove a motivação, reduz a ansiedade e extingue progressivamente os
comportamentos inadequados. O erro cerceia a iniciativa e deve ser evitado a
todo custo.
DESENVOLVIMENTO
EM DOMÍNIOS ALTERNATIVOS
As
dificuldades apresentada por muitos jovens não são de ordem intelectual, mas
motivacional. Não lhes falta capacidade, o que falta é motivação. Indivíduos
com características comportamentais de hiperatividade, impulsividade e
impersistência têm mais dificuldades do que outras pessoas para aprender a
regular seu comportamento por metas futuras. Umas das habilidades
auto-regulatórias fundamentais que o indivíduo precisa adquirir para ter um bom
desempenho escolar e, posteriormente, profissional, é a capacidade de postergar
a gratificação. Postergar a gratificação significa realizar no momento atual
tarefas que são percebidas como aborrecidas - tais como estudar - com o intuito
de receber recompensas no futuro - sob a forma de notas, elogios de pais e
professoras e auto-realização.
O
bom desempenho escolar exige que o indivíduo abdique da gratificação imediata
dos seus desejos em função de recompensas futuras. Algumas pessoas têm
dificuldades em adquirir esta habilidade no contexto acadêmico. Uma alternativa
então é desenvolver esta habilidade de postergação da gratificação em outros
domínios. O ideal é que a criança ou adolescente se envolva em atividades
extracurriculares que lhe permitam adquirir habilidades sociais, cognitivas e,
eventualmente, profissionais em um contexto que não seja percebido como
aversivo.
Se
uma criança ou adolescente demonstra interesse por algum domínio da atividade
humana, social ou profissional, o mesmo pode ser cultivado de modo que a pessoa
aprenda a perceber as relações entre seus esforços e o resultado final,
desenvolvendo um senso de responsabilidade e participação social e, ao mesmo
tempo, contribuindo para adquirir habilidades e construir sua identidade
pessoal e auto-estima.
Ninguém
nasce gostando de estudar. O gosto pelo estudo se aprende. Alguns aprendem com
mais facilidade. Outros têm mais dificuldade. O fracasso escolar desmotiva para
o estudo. Quando isto acontece é importante desviar a atenção das dificuldades
e do estudo, envolvendo a adolescente com outras atividades que possam
igualmente lhe dar oportunidade de aprender que existe uma relação entre o
esforço e o resultado. Algumas pessoas são mais imediatistas. Necessitam
resultados mais concretos e imediatos para garantir o envolvimento com uma
tarefa. Somente o sucesso na realização de uma tarefa aumenta a auto-estima e
motiva o indivíduo para querer se aperfeiçoar ainda mais. Nem todos nasceram
para nerd. Existem muitos domínios da atividade humana nos quais uma pessoa
pode se desenvolver e aprender a ser produtiva. Se a pessoa tem dificuldades em
uma área, pode procurar alternativas para se realizar. A realização em outros
domínios acabará promovendo o desenvolvimento das habilidades em que a pessoa
tem mais dificuldade.
PROBLEMAS
COM A PUNIÇÃO
Pais
e educadoras freqüentemente reagem ao fracasso escolar com medidas punitivas. A
punição é um método pedagógico muito ineficiente. A punição desmotiva e
contribui para que o indivíduo perceba a tarefa como aversiva. As dificuldades
com a punição são diversas: 1) é muito difícil punir de forma consistente e a
inconsistência inclina o indivíduo a correr o risco de se comportar mal; 2) a
punição excessiva ou percebida como injusta, desmoraliza e revolta; 3) a
punição somente funciona a curto-prazo; 4) a punição não contribui para o
desenvolvimento de habilidades, 5) a punição exagerada pode levar a abuso; 6) a
punição desgasta as relações familiares e entre a professora e a aluna, fazendo
com que pais e educadoras diminuam o grau de supervisão; 7) a punição faz com
que o indivíduo desenvolva estratégias de isolar os esforços educacionais de
pais e professoras, 8) a punição distancia afetivamente e diminui o senso de
identidade entre a criança e as autoridades parentais e escolares; 9) alguns
indivíduos, denominados psicopatas, são insensíveis aos efeitos da punição. A punição
deseduca: afastando as crianças dos pais e educadoras, a punição retira os
jovens da órbita de influência da autoridade. Punições desproporcionais,
injustas ou excessivas podem motivar o jovem a se comportar deliberadamente de
modo inadequado. Se castigo desse resultado não haveria bandido no mundo.
DISCIPLINA
EFICIENTE: INCENTIVO E SUPERVISÃO
As
estratégias disciplinares mais eficazes são o incentivo e a supervisão. O
incentivo opera maravilhas. Face a dificuldades em um domínio, o estímulo a outras
atividades em que o indivíduo tenha maior motivação ou habilidade pode promover
a responsabilidade, engajamento, cooperação, desenvolvimento pessoal etc. A
criança desenvolve a qualidade elogiada. Elogiando sistematicamente o
comportamento adequado, a atenção é desviada dos maus comportamentos ou dos
fracassos. As dificuldades passam para um segundo plano. O elogio aumenta a
freqüência dos comportamentos adequados, promovendo a aquisição de habilidades
e competências. Ao mesmo tempo, na medida em que a atenção é retirada dos
comportamentos inadequados, os mesmos deixam de ser reforçados e diminuem
progressivamente de freqüência. O incentivo ao bom comportamento funciona
melhor quando a atenção é retirada dos comportamentos inadequados. Isto se
chama de reforçamento diferencial. Quanto mais se presta atenção em um
comportamento, mais tal comportamento é reforçado. É preciso então atentar para
o bom comportamento e ignorar o mau comportamento.
Mas
apenas o reforçamento diferencial não basta. A supervisão é o segundo
ingrediente da disciplina competente. A supervisão transmite ao jovem a
sensação de interesse, controle e proteção. A supervisão atua de forma
preventiva, impedindo que o jovem caia em tentação, sofra influência indevidas
ou se envolva em atividades não-recomendáveis. O problema com a supervisão é
que ela custa esforço e exige auto-controle do adulto. Ao desgastar as relações
familiares, tornando a convivência aversiva, a punição reduz o nível de
supervisão, afastando a adolescente do convívio e influência de pais e
educadoras. Na adolescência diminui a influência da família e aumenta a dos
pares. A falta de supervisão coloca o jovem em risco de sofrer influência de
pares desviantes. Se o jovem estiver supervisão e pensar besteira, ele corre o
risco de fazer besteira. A supervisão é uma forma de carinho. A supervisão
opera preventivamente, ensinado ao jovem o que ele pode e o que não pode fazer.
A supervisão transmite segurança e promove a competência e a autonomia.
EFEITO
PIGMALIÃO
Segundo
o mito, Pigmalião era um escultor grego muito habilidoso. Ele esculpiu uma
figura feminina a que chamou de Galatéia. Pigmalião era tão hábil e Galatéia
uma figura feminina tão bela que o escultor acabou se apaixonando porsua obra.
O mesmo acontece em casa e na escola. Se os pais ou educadoras têm expectativas
altas a respeito de um aluno, eles investem mais no seu aprendizado. E...,
bingo!, o aluno aprende cada vez mais e melhor. O efeito Pigmalião consiste em
uma forma de profecia auto-realizável muito prevalente. Por outro lado, o que
acontece quando pais e educadores têm expectativas mais baixas a respeito de
uma criança? A resposta é óbvia, tanto familiares quanto educadores investem
menos na educação da criança e a professia auto-realizável se cumpre também. Ou
seja, a criança acaba aprendendo menos ainda ou se comportando cada vez pior.
Este é o famoso efeito Pigmalião invertido. Mas a situação toda pode piorar. Se
a criança é percebida como importuna ou levada, pais e educadoras prestam
atenção apenas no seu mau comportamento. Quando a criança se comporta bem, o
adulto pensa que ela não faz nada mais do que sua obrigação. Já quando a
criança se comporta mal, recebe uma reprimenda. O efeito Pigmalião invertido
reforça o mau comportamneto. Pais e educadores devem investir no efeito
Pigmalião. Se o desempenho da criança é olhada com óculos cor-de-rosa, a
aprendizagem tende a melhorar e os comportamentos inadequados diminuem
progressivamente de freqüência.
CONCLUSÕES
Os
fenômenos psicológicos humanos são o desfecho de um processo delicado em
complexo de interação entre influências genéticas e ambientais. A influência
dos pais e educadoras é muito grande. Abandono e maus tratos têm conseqüências
graves para o desenvolvimento do indivíduo, repercutindo, na maioria das vezes,
sob a forma de psicopatologia. A qualidade do cuidado parental e educação se
correlaciona com o sucesso educacional, profissional, status social, renda,
qualidade de vida, saúde etc. O desenvolvimento pode ser equiparado a uma
máquina de fazer salsicha. Se colocar carne de primeira de um lado, sai uma
salsicha melhor do outro.
Por
outro lado, a influência dos pais e educadores têm limites. Pais e educadoras
não são omnipontes. A razão é que, assim como existtem influências ambientais,
também exisem influências genéticas poderosas. Se entra carde de frango de um
lado não tem como sair lingüiça suína do outro. Devido às influências
genéticas, cada indivíduo nasce com um perfil de habilidades, de pontos fortes
e fracos, relativamente definidos. As características temperamentais são,
inclusive, mais fortemente pre-programadas dos que muitas habilidades
cognitivas.
De
uma certa forma, o pacote já vem pronto. O que os pais fazem é deembrulhar o
pacote e aprender a conviver, adaptar-se às características da criança. Cada
indivíduo tem suas virtudes e vicios. De uma certa forma, o máximo que os pais
podem fazer é aprender a conviver com os filhos. Incentivar os seus pontos
fortes e moderar seus pontos fracos. Um grande objetivo educacional é amortecer
as repercussões negativas que determinadas características individuais têm
sobre o ambiente. Pais e crianças precisam aprender a conhecer seus limites e a
respeitar-se mutuamente. Não adianta nada criar expectativas irrealizávaeis. A
sabedoria consiste em investir onde se pode obter retorno e não insistir com
trilhas que estão vedadas. Se o indivíduo é protegido das conseqüências
adversas dos seus pontos fracos por um certo tempo, ele pode ganhar a possibilidade
de desenvolver outras habilidades que compensem suas dificuldades e
possibilitem a auto-realização.
Os
objetivos educacionais só podem ser atingidos na medida em que pais e educadoes
aprenderem a conhecer e a respeitar os limites e potencialidades da criança,
investindo nas potencialidades e minorando as dificuldades. Para atingir os
objetivos educacionais, pais e educadoras precisam, antes de mais, desenvolver
uma visão realista das suas próprias virtudes e limitações, do que eles podem e
devem e do que eles não podem e não devem fazer.
Dificuldades
comportamentais e de aprendizagem eliciam reações negativas do ambiente. As
quais retroalimentam sobre as dificuldades, agravando-as. O desenvolvimento bem
sucedido de crianças e adolescentes com dificuldades de comportamento e de
aprendizagem exige que o ciclo vicioso seja rompido. A parte fraca é a criança.
Quem tem condições de romper o ciclo é o adulto. O poeta Kahlil Gibran
1883-1931) escreveu uns versos que são extremamente pertinentes no contexto
atual:
“Seus filhos não são seus filhos,
são filhos e filhas do apelo da própria vida.
Vêm por meio de vocês, mas não de vocês.
E embora estejam com vocês,
não lhes pertencem.
Vocês podem dar-lhes seu amor,
mas não os seus pensamentos,
porque eles têm seus próprios pensamentos.
Vocês podem acolher seus corpos,
mas não suas almas,
pois suas almas habitam a casa do amanhã,
que vocês não podem visitar,
nem mesmo em seus sonhos.
Vocês podem fazer esforço para ser como eles,
mas não tentem torná-los iguais a vocês,
porque a vida não anda para trás
nem se retarda como o ontem.
Vocês são arcos através dos quais
seus filhos são projetados como flechas vivas.
Que sua mira pela mão do Arqueiro
Seja para a Alegria”.
Kalil Gibran