Sunday, June 03, 2018

SFON: FOCO ESPONTÂNEO NA NUMEROSIDADE

A questão de um bilhão de dólares é: quais são os precursores da aprendizagem da aritmética? A aritmética é um domínio complexo e sua aprendizagem depende de várias habilidades cognitivos. É plausível, portanto, que vários precursores sejam caracterizados e possam ser utilizados no diagnóstico precoce de crianças sob risco de desenvolverem dificuldades de aprendizagem da matemática.

Um dos possíveis precursores identificados é o foco espontâneo na numerosidade ou “spontaneous focus on numerosity”, também conhecido como SFON (Hannula-Sormunen, 2015). As crianças em idade pré-escolar variam quanto ao nível de atenção que investem espontaneamente  na numerosidade. Quaisquer estimulos ou eventos se compõem de múltiplas dimensões que podem capturar a atenção, tais como cor, forma, movimento, som, ritmo etc. A numerosidade é mais uma dessas dimensõe que podem capturar espontaneamente a atenção das crianças. 

As pesquisas de Hannula-Sorminen (2015) com crianças em idade pré-escolar mostra que o SFON é preditivo do desempoenho em matemática sete anos depois. Uma das tarefas empregadas é a seguinte. O examinador convida a criança a participar de um jogo de imitação. Pode à criança que imite o seu comportamento. O examinador, então “alimenta” então um boneco, oferecendo-lhe um número variável de balas. O número de vezes que o examinador “alimenta” o boneco varia de um ensaio para outro. Após cada demonstração, a criança repete o comportamento do examinador. Algumas crianças prestam atenção e reproduzem fielmente o número de balas que o examinador ofereceu para o boneco. Outras crianças não prestam atenção na numerosidade. As crianças que prestam atenção espontaneamente à numerosidade apresentam melhor desempenho em matemática no futuro.

Essas diferenças interindividuais podem ser resultado do fato que algumas crianças podem ser mais sensíveis à informação numérica. Elas se ligariam mais nos números. Desde novinhas. Uma possiblidade alternativa é que as crianças com maiores níveis de SFON tenham representações não-simbólicas de numerosidade mais precisas.

Ben-Shachar, Shotts-Peretz ,   Hannula-Sormunen, e  Berger (2018, cit. in Beh-Schachar e Berger, 2018) investigaram a hipótese de que as crianças que prestam mais atenção espontaneamentente à numerosidade disponham de representações não-simbólicas de numerososade mais precisas. A acurácia das representações não-simbólicas de numerosidade foi operacionalizada como fração de Weber interna (w). Ou seja, como a menor diferença proporcional de numerosidade entre dois conjuntos que a criança consegue discriminar. Os resultados mostraram uma associação entre a fração de Weber o SFON (Figura 1).


Figura1 - Associação entre foco espontânea numerosidade (SFON) e acurácia das representações não-simbólicas de magnitude (w) observada no estudo de Ben-Shachar, Shotts-Peretz,   Hannula-Sormunen, e  Berger (2018, cit. in Ben-Schachar e Berger, 2018).

Esse resultado é fascinante. Sugere que, através de brincadeiras muito simples, os pais e professores podem identificar se a criança está ligada ou não nos números e pode incentivá-la a prestar atenção na numerosidade. Uma outra intervenção poderia variar as razões entre os números de vezes que o boneco é “alimentado” em cada ensaio. P. ex., ver qual é a mínima diferença que a criança consegue perceber. E a seguir treinar a discriminação de numerosidade a partir de uma diferença supralimiar. 

Obviamente, isso aí não vai resolver o problema do diagnóstico precoce e intervenção para discalculia. Tem muito mais coisa em jogo. Mas esse parece ser um fator importante. Se a crianças não presta atenção espontaneamente na numerosidade, sua atenção pode ser direcionada para os números. Isso daria uma pesquisa bem legal.

Referências

Ben-Schachar, M. S. and Berger, A. (2018). An introduction to attention and its implication for numerical cognition. In A. Henik & W. Fias (eds.) Heterogeneity of function in numerical cognition (pp. 93-110). San Diego: Academic.

Ben-Shachar   M. S,   Shotts-Peretz   D,   Hannula-Sormunen   M,   Berger   A. (2018).  Spontaneous focusing on numerosity among adults and children  ( in preparation).  


Hannula-Sormunen, M. M. (2015). Spontaneous focusing on numerosity and its relation to counting and arithmetic. In R. Cohen Kadosh & A. Dowker (eds.) Oxford handbook of numerical cognition (pp. 275-290). Oxford-University Press.

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