Monday, November 16, 2020

THOMAS SOWELL E A LAVAGEM CEREBRAL NA SALA DE AULA

A lavagem cerebral em sala de aula é um problema no mundo todo, incluindo o Brasil. Aqui no Brasil, nós tivemos uma proposta muito interessante, o projeto "Escola sem Partido" (ESP). Eu sou muito crítico em relação a essas propostas de mudar a sociedade por decreto. Não gosto disso. Minha índole  política oscila entre o conservadorismo britânico alla Burke e o libertarianismo alla Murray Rothbard. Por vezes um fala mais alto, por vezes outro. Nessa questão do ESP, o Rothbard ganhou a parada.


Apesar das reservas, apoiei o ESP. Inclusive tive a honra de participar de uma audiência pública na Câmara dos Deputados, discutindo o problema do ativismo político na Universidade (Haase, 2017). Após o ensino, pesquisa e extensão, a Universidade assumiu uma nova missão, o ativismo político. Minha reserva em relação ao ESP se deve à alergia de apoiar mudanças sociais na marra. As mudanças que interessam devem vir de baixo para cima e não de cima para baixo. E o ESP conseguiu isso. O ESP conseguiu colocar a doutrinação escolar na ordem do dia. Criaram-se grupos de pais nas redes sociais denunciando casos escabrosos. Foram submetidos projetos semelhantes em estados e municípios etc. Foi muito inspirador. Infelizmente, esse movimento refluiu. Levou dois baldes de  água fria, um do STF e outro do Bolsonaro.  Sobrou a alternativa bottom-up, do trabalho de formiguinha que precisamos fazer para não deixar essa questão morrer.

Recentemente tive a oportunidade de reler um livro maravilhoso do Thomas Sowell (1993), intitulado "Inside American education". O Sowell é um cara surpreendente, a quem eu não canso de admirar. Algumas das cenas mais divertidas que eu já vi no YouTube são videos do Sowell desbancando na maior categoria e civilidade os argumentos de socialistas, feministas etc. Adoro em especial um video no qual o Milton Friedman está participando da discussão e fica se divertindo. Assim como se tivesse pensando: "Esse é o meu garoto". E o Sowell impecavelmente vestido, falando de modo calmo e educado, apesar da língua presa, conservador com aquele cabelo afro da Década de 1960. Impagável.

A outra coisa surpreendente é a capacidade do Sowell de lidar com dados. Ele pega as estatísticas mais corriqueiras e as examina de forma inusitada. Um exemplo  é o recente "Charter schools and their enemies", escrito aos noventa anos de idade (Sowell, 2020). O Sowell parece pastel de palmito da Rodoviária: quanto mais velho melhor.

"Inside American education" é de 1990 e poucos.  A primeira seção do livro é sobre as escolas. O primeiro capítulo é sobre o anti-intelectualismo na formação de professores, o segundo sobre lavagem cerebral nas escolas e o terceiro sobre a ideologia subjacente. Foi escrito há quase trinta anos, mas continua atual. Vou me concentrar aqui na questão da lavagem cerebral.

As estratégias gramscianas de lavagem cerebral nas escolas já foram analisadas no "Maquiavel pedagogo" (Bernardin, 2013). "Maquiavel pedagogo" é um livro muito bom, recomendável. O "Maquiavel" se baseia em pesquisa psicológica da melhor qualidade. Infelizmente, a orientação teórica é um pouco antiquada, baseada na psicologia social dos Anos 60. De lá para cá, muita água foi trazida a esse moinho. Sowell (1993), propõe uma abordagem bem mais simples, mais direta, mais cognitiva. O objetivo da lavagem cerebral é uma mudança das atitudes e valores da criança.

O primeiro problema que Sowell resolve é definir o que é lavagem cerebral nas escolas e dar exemplos. Quando se discute esse assunto da lavagem cerebral nas escolas, um argumento freqüentemente esgrimido é o negacionismo. Ou seja, simplesmente negar que o problema exista. Sowell resolve isso na medida em que fornece critérios claros do que é do que não é lavagem cerebral. Depois ele dá uma série de exemplos. Vale a pena citar por extenso.

"Uma variedade de programas usados ​​em salas de aula em todo o país não apenas compartilham os objetivos gerais de lavagem cerebral - isto é, mudar atitudes, valores e crenças fundamentais por métodos de condicionamento psicológico - mas também usam técnicas clássicas de lavagem cerebral desenvolvidas em países totalitários: a) Estresse emocional, choque ou dessensibilização, para quebrar a resistência intelectual e emocional; b) Isolamento, seja físico ou emocional, de fontes familiares de apoio emocional na resistência; c) Confrontação de valores pré-existentes, geralmente manipulando pressão dos colegas em sessões de acareação;  d) Tirar do indivíduo as defesas normais, como reserva, dignidade, senso de privacidade ou a capacidade de recusar-se a participar; e) Recompensa a aceitação das novas atitudes, valores e crenças - uma recompensa que pode ser simplesmente liberação das pressões infligidas àqueles que resistem, ou pode assumir outra forma simbólica ou tangível” (Sowell, 1993, p. 57).

Muitos dos exemplos que Sowell discute são retirados de um relatório do Governo Americano (Schlaffly, 1988). Quer dizer, há mais de 30 anos isso já era um problema reconhecido pelo Governo Americano da época. 


Os critério oferecidos por Sowell (1993) ajudam a identificar quando a lavagem cerebral está ocorrendo. A seguir vou mencionar alguns dos exemplos que o Sowell discute:

a) Choque e dessensibilização: O objetivo aqui é chocar, criar dissonância cognitiva e habituar a criança a comportamentos, atitudes e valores fora da curva. Sowell (1993) menciona vários exemplos de programas de "educação par a morte", nos quais, entre outros projetos, as crianças são instadas a visitar um necrotério e tocar nos mortos, escrever sua própria nota de suicídio etc. Em um projeto de educação sexual, as crianças assistiam a um video de uma mulher colocando um absorvente íntimo. Noutros projetos, os meninos precisavam gritar repetidamente "vagina" e as meninas "pênis". Esses projetos são academicamente tão irrelevantes e pueris que lembram o menino e a menina que ficam mostrando os seus "pipis" um para o outro. Só que o objetivo aqui é violar a inocência das crianças. Fizeram furor no Brasil os "projetos" que levaram crianças a museus de arte para assistir e ter aulas sobre exposições com conteúdo sexual apelativo. São freqüentes também no ambiente escolar brasileiro, os "projetos" em que crianças dançam funk de forma lasciva. Já vi foto de dois bebês dançando funk de fraldas.

b) Isolamento da cultura familiar de origem: Uma das principais estratégias da lavagem cerebral é promover o conflito entre pais e filhos, isolando a criança do conforto e apoio da família, ridicularizando os valores familiares e promovendo a vergonha dos pais. Sowell (1993) menciona um projeto que envolvia um "Círculo Mágico". Tudo que acontecesse e fosse dito dentro daquele círculo não deveria ser comentado com os pais. 

c) Confrontação pelos colegas e ostracismo: Quando um menino tem uma opinião conservadora, dissonante daquela do professor, o mesmo incita a turba para massacrá-lo até que ele muda de idéia. Sowell (1993) cita o exemplo de um professor que solicitou repetidamente a um aluno que reiterasse uma opinião conservadora, apenas para expô-lo perante os colegas. Depois de algumas vezes de insistir para que a criança se pronunciasse, o menino comentou: "Mas por que você só fica pedindo para que eu fale? Só eu?" Nem assim o professor parou. No Brasil isso acontece muito com os evangélicos ou alunos conservadores, que são provocados a se manifestar, apenas para sofrer uma acareação ostensiva e agressiva por parte dos colegas.

d) Desmoralização: Um menino que ficou constrangido em ficar repetindo bobamente "vagina, vagina, vagina etc." durante o tal "projeto" foi ridicularizado pelo professor e colegas. Os evangélicos que ousam manifestar suas opiniões são ridicularizados. Tudo isso promove um ambiente anti-acadêmico. O contrário do que se desejaria ver na escola. Por vezes tenho a impressão de que muitos professores pregam pela cartilha do Rousseau mas, realmente, praticam pela cartilha pedagógica do Maquiavel. Impressionamente como conseguem agredir e ridicularizar sem pudor os alunos divergentes. 

e) Reforço ao conformismo: A acareação e a desmoralização reforçam o conformiso. A diversidade de pensamento é tolhida em nome da diversidade. Isso acontece muito com os evangélicos, que não têm espaço para se manifestar em sala de aula. Uma vez me chamou atenção um cavalete escondido em um cantinho atrás do elevador. Fui espiar. Tinha um cartaz anunciando uma reunião de um grupo de universitários evangélicos. Acha que era um momento de discussão e de oração. Comigo acontece também com alunos e colegas na Universidade. Às vezes ouço o pessoal comentando a partir de pressupostos que considero absurdos. Eu certamente teria meia dúzia de argumentos e evidências para questionar tais pressupostos. Entretanto, sou obrigado a calar. Uma vez eu estava organizando um evento e uma colega quis vetar um convidado que eu havia sugerido porque o cara é conservador. Tudo isso é um grande estímulo a ficar de boca fechada. Para quem pode.

O ESP refluiu. Por causa disso mesmo esse trabalho bottom-up de botar a boca no trombone, de denunciar, de não se conformar, de não aceitar os abusos é extremamente importante. Gostei tanto dos critérios do Sowell, que estou pensando em fazer uma coleção de episódios. Quem quiser contribuir, narrando seu causo, encontrará ouvidos atentos. 


Referências

Bernardin, P. (2013). Maquiavel pedagogo. Ou o ministério da reforma psicológica. Campinas: Eccleasiae/Vide Editorial.

Haase, V. G. (2017). Ativismo político na universidade. Brasília: Câmara dos Deputados, Comissão Especial - Escola sem Partido.

Schlaffly, P. (1988). Child abuse in the classroom. Westcheste, Ill: Crossway.

Sowell, T. (1993). Inside american education. New York: Free Press.

Sowell, T. (2020). Charter schools and their enemies. New York: Basic Books.

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