A neuropsicologia cognitiva se caracteriza, entre outras
coisas, pela utilização de modelos de processamento de informação no
diagnóstico neuropsicológico. Além de serem localizados anatomicamente,
inclusive no nível genético-molecular, os comprometimentos neuropsicológicos
podem ser localizados virtualmente, através dos modelos.
Os modelos nos ajudam a identificar os processos
psicológicos comprometidos e preservados, contribuindo então para o diagnóstico
e planejamento das intervenções. A relação entre os modelos e o diagnóstico é,
em grande parte tautológica. Os modelos
auxiliam no diagnóstico mas, ao mesmo tempo, os diagnósticos são úteis
para validar e aperfeiçoar os modelos. É
um processo iterativo, de aproximações e modificações sucessivas. A
natureza tautológica do processo requer alguma fonte externa de validação,
geralmente algum critério biológico, tal como uma dissociação nos sistemas
neurais comprometidos e preservados ou a identificação de algum endofenótipo correlacionado a
especificidades genético-moleculares.
Um dos modelos neuropsicológicos mais bem sucedidos é o
modelo de dupla-rota da leitura. O modelo de dupla-rota foi construído a partir
do estudo das alexias adquiridas em adultos. Mas é perfeitamente aplicável ao
estudo da dislexia do desenvolvimento. O modelo da dupla-rota postula a
existência de mecanismos fonológicos e lexicais para a leitura. A aprendizagem começa
utilizando-se de processos fonológicos e, gradualmente, à medida que o processo
se automatiza, preponderam os processos lexicais.
O modelo foi validado por inúmeros estudos comportamentais e
neurofuncionais, mas se presta também a análise da dislexia do desenvolvimento.
Talvez seja Na’ama Friedman a pesquisadora que mais explorou as possibilidades
do modelo de dupla-rota para a compreensão da dislexia do desenvolvimento.
Trabalhando com falantes nativos de hebraico e árabe, Friedman mostrou que o
modelo de dupla rota pode tanto ser usado para validar subtipos de dislexia
como, e o que é mais interessante ainda,
prever a existência de novos subtipos que posteriormente foram descobertos. Se
você quiser ler um pouco mais sobe isso, veja o meu post sobre os dezenove subtipos de dislexia.
É bom lembrar que esse valor heurístico, preditivo da
neuropsicologia já havia sido explorado por Wernicke e Lichtheim nos tempos
heróicos da disciplina. Com base no seu modelo anatômico da linguagem, Wernicke
previu a existência de uma afasia de condução, a qual foi posteriormente descoberta
por Lichtheim. Ou seja, a neuropsicologia não é apenas uma disciplina
descritiva, mas contribui também com predições e explicações.
Contemporameneamente são os modelos que nos ajudam a fazer essas predições e
a buscar as explicações nos limites do que conseguimos.
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