Thursday, May 10, 2018

QUAL É A PREVALÊNCIA DA DISCALCULIA NO BRASIL?

As informações mais confiáveis sobre a prevalência da discalculia no Brasil foram obtidas por Fortes e cols. (2016) em um estudo sobre a prevalência de transtornos de aprendizagem conforme o DSM-5. 

O estudo investigou uma amostra de mais de 1600 crianças entre o 2o. e o 6o. ano do ensino fundamental de quatro cidades das regiões Sudeste, Nordeste, Centro-Oeste e Norte do Brasil. O critério diagnóstico usado para caracterizar os transtornos de aprendizagem foi um desempenho  inferior a 1,5 desvio-padrão abaixo da média nos subtestes do TDE avaliando leitura de palavras, ortografia de palavras e aritmética. O controle da inteligência, para não incluir na amostra crianças com deficiência intelectual, foi realizado através dos subtestes Cubos e Vocabulário do WISC. Uma entrevista psiquiátrica padronizada (K-SADS) foi usada para investigar a freqüência de comorbidades dos transtornos do desenvolvimento com as formas mais comuns de psicopatologia na idade escolar.

Os resultados obtidos por Fortes e cols. (2016) permitiram estimar a prevalência de diversas formas de transtornos específicos de aprendizagem no Brasil (Tabela 1). 

Tabela 1 - Prevalência de transtornos de aprendizagem no Brasil
(cf. Fortes et al., 2016)


Os autores não calcularam e também não apresentaram dados que permitissem calcular as taxas do comorbidade entre cada um dos transtornos específicos. Entretanto, a partir dos dados apresentados é possível inferir que 44% dos casos de discalculia ocorrem isoladamente, sendo as taxas correspondentes iguais a 49% e 42%, respectivamente, para dislexia e disortografia. Os dados indicam, portanto, que a co-ocorrência de transtornos de aprendizagem é mais comum do que sua ocorrência isolada. 

As comorbidades com outros transtornos psiquiátricos comuns na idade escolar foram maiores nas crianças com dificuldades de aprendizagem do que na população. O TDAH foi diagnosticado em 12,4% das crianças com discalculia e em 8,2% das crianças com transtorno misto de aprendizagem, comparativamente a cerca de 4% na população sem transtornos de aprendizagem. 

Uma associação específica entre discalculia e transtornos de ansiedade fo detectada. Um diagnóstico de transtorno de ansiedade foi realizado em 13.8% das crianças com discalculia comparativamente a apenas 6.1% das crianças sem transtornos de aprendizagem. De um modo geral, 26,6% das crianças com discalculia apresentaram algum tipo de transtorno psiquiátrico comparativamente a 11,8% na população sem transtornos de aprendizagem.

Finalmente, foram observadas associações estatisticamente significativas entre a presença de transtornos de aprendizagem e QI (positiva), idade (positiva), NSE (negativa) e região (pior do Norte e Centro-Oeste do que no Nordeste e Sudeste). Uma maior freqüência no sexo masculino foi observada para os transtornos comprometendo a linguagem. 

Comentários

O estudo é importante porq ser o único que estimou a prevalência de transtornos de aprendizagem no Brasil usando uma metodologia adequada.

Ao menos dois problemas devem ser notados. O estudo não amostrou na região Sul do Pais. Não foram apresentados dados quanto à comorbidade dos diversos transtornos de aprendizagem entre si.

Algumas conclusões são possíveis. Em primeiro lugar, as formas isoladas de transtornos de aprendizagem são menos freqüentes do que sua ocorrência.

Em segundo lugar, as altas taxas de comorbidades com outros transtornos psiquiáticos indicam que os transtornos de aprendizagem constituem um fator de risco para múltiplos comprometimentos da saúde mental.

Em terceiro lugar, as associações entre discalculia e problemas de psicopatologia, tais como TDAH e ansiedade são especialmente importantes. 

Em quarto lugar, os seguintes fatores de riscos foram identificados para o aparecimento de transtornos de aprendizagem: idade, QI, NSE e diferenças regionais.

Em quinto lugar, diferenças entre os sexos foram detecatadas apenas para os transtornos comprometendo a linguagem verbal, com maior freqüência entre os meninos.


Referência

Fortes, I. S., Paula, C. S., Oliveira, M. C., Bordin, I. A., de Jesus Mari, J., and Rohde, L. A. (2016). A cross-sectional study to assess the prevalence of DSM-5 specific learning disorders in representative school samples from the second to sixth grade in Brazil. European Child & Adolescent Psychiatry, 25, 195-207.






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